No meio de toda essa mixórdia de manipulação, meias-verdades (que sempre são mentiras inteiras) que vemos cotidianamente, ainda não vi quem colocasse o dedo em uma ferida que, no meu entendimento, arrombou o espaço para isso.
Cadê o Samuel Wainer de hoje?
Isso resume a questão.
A ênfase unilateral na participação nas redes sociais deixou o PT e o governo – por conta da política de comunicação social adotada pelos sucessivos responsáveis por essa área vital sem meios de ação. E não falo nem do governo – pois também não defendo nenhuma imprensa chapa branca e oficialista – mas de todos os segmentos progressistas da sociedade brasileira, ou que precisam ser mais informados para poder se posicionar sem manipulação.
É certo que os blogs vários das redes sociais são – até certo ponto – um contraponto para a grande imprensa.
Mas as limitações são muito grandes, e sérias.
Em primeiro lugar, convém não superestimar o alcance dos “cliques” divulgados. A geração de “cliques” se multiplica quando se entra em um dos blogs, e cada matéria consultada gera mais. Dessa maneira, os números apresentados devem ser vistos com muita cautela. Sinceramente, é de morrer de rir quando se escuta alguns editores desses blogues dizerem que tem “mais de um milhão de leitores”.
Em segundo lugar, a polarização atual nas redes sociais fez com que os leitores dos blogs sejam, em 99,9% dos casos, os já convencidos da manipulação da grande imprensa. E vice-versa. Ou seja, os blogs falam principalmente para os crentes – dos dois lados.
Ou alguém consulta o blog dos reinaldos e olavos para se informar?
Por isso mesmo, o objetivo de estender para o conjunto da população, desinformada pelos jornalões, informações sobre o que acontece é totalmente frustrada.
Moro em S. Paulo e andar pela Av. Paulista é uma experiência terrível. Todas as bancas de jornais mostram as MANCHETES esculhambando o governo e o PT. E a porcaria do Hora do Povo apenas ecoa tudo isso, com um falso perfume “de esquerda”. Já sabemos, há muito, que esse jornal é somente uma folha de aluguel, que já passou por muitas mãos e continua disponível para o melhor postor.
As análises dos noticiários mostram, abundantemente, que a manipulação se dá, principalmente, na construção das manchetes. Lá no pé das notícias muitas vezes a informação correta até aparece (nem sempre, mas com mais frequência do que se imagina).
Mas, quem lê as matérias com atenção (e paciência!) para tentar distinguir o joio do trigo? São pouquíssimas pessoas, e geralmente profissionais de comunicação já habituados a perceber a calhordice atual que predomina nas redações.
O povão só vê as manchetes, e as capas dos semanários (com a Carta Capital nem de longe concorrendo em exposição). E forma sua opinião a partir dessas manchetes.
Recentemente, por ocasião de um debate no lançamento do livro “Cartas a Lula”, do Bernardo Kucinsky, estavam presentes na mesa o Franklin Martins e o André Singer, entre outros. Na plateia, vários companheiros diretores de blogs.
Franklin foi assertivo em sua teoria: os jornalões estão acabando, o futuro é o jornalismo eletrônico. A única concessão que fazia era em relação às rádios – nas quais apanhamos de modo ainda mais virulento.
Ora, pergunto eu, será que os donos dos jornais não percebem isso e insistem inutilmente nesse troço fadado ao fracasso, a caminho do desaparecimento?
É subestimar demais a inteligência dos adversários, e não entender porra nenhuma da dinâmica de classes em nossa sociedade.
As empresas jornalistas se diversificam. É o UOL na Folha, os serviços de assinaturas “Broadcast” do Estadão, a rede Globo atrás do jornalão, e por aí vai. Uns com mais, outros com menos êxito nessa tarefa.
As empresas se diversificam – e conseguem dinheiro com isso – porque compreendem muito bem seu papel na nossa sociedade. E são pagos pelas grandes empresas (e também pelo governo, a pretexto da famosa “análise técnica da circulação”) para cumprir seu papel.
Isso é que os “teóricos” do desaparecimento dos jornalões não conseguem perceber: os jornais são parte do aparelho de dominação de classe, e a classe dominante continuará sustentando-os. Podem até uns serem substituídos por outros. Afinal, o capitalismo também não perdoa determinados graus de estupidez, como mostram, por exemplo, o caso do JB no Rio e do Diário de S. Paulo, aqui. Ambos, que já foram do topo dos jornalões, findaram melancolicamente. E foram substituídos por outros.
Esses “teóricos” não percebem que nas sociedades capitalistas mais avançadas pode até existir grandes jornais com amplitude e critério de informação. Mas só tontos acham que o New York Times, o Le Monde ou o The Guardian são “neutros”. A complexidade dessas sociedades permite – diria até, exige – que haja contraponto de opiniões entre os diferentes segmentos das classes dominantes. Na Pindorama, nem isso. A uniformidade é total, acabrunhante, esmagadora e desmoralizante.
Fazer um jornal de qualidade, com distribuição nacional, é hoje infinitamente mais fácil que no período da Última Hora. Este jornal é que foi um exemplo fantástico. Não se eximia de publicar o que muitos carrancudos chamam de frivolidades (Certinhas do Lalau, crônicas esportivas do Nelson Rodrigues, etc.), mas abria espaço, nas manchetes e nas matérias, para uma interpretação mais decente do movimento político e econômico.
Agora, por favor, não me venham com uma coleção de colunistas, cabeças pensantes, achando que isso é jornal. Tem que ter o cotidiano das cidades, programas de cinema, teatro e espetáculos, reclamações sobre os buracos nas ruas e o mau atendimento nos postos de saúde. Também.
Mas, sobretudo, REPORTAGEM, conteúdo seriamente trabalhado e que não manipule as informações.
Getúlio teria caído pelo menos uns dois anos antes, JK seria deposto e o Jango também nem tomaria posse se não existisse – entre outros fatores, é claro – uma imprensa (com rádio, inclusive) decente fazendo o contraponto. Não impediram o golpe, mas o retardaram bastante.
As tentativas existentes (como a TV Brasil, por exemplo, que tem ótimo conteúdo) são boicotadas pela grande imprensa, que sufoca a audiência e a deixa lá embaixo.
Enfim, e para nem citar outros velhos revolucionários, nós esquecemos o papel da imprensa, menosprezando o que pode ser feito.
E estamos pagando muito caro por isso.
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As capas de jornais foram copiadas do blog do Mário Magalhães, pelo que agradeço.
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