A crise política se alimenta da crise econômica, e vice-versa. Isso é inevitável.
O que é evitável – em tese, pelo menos – é a incompetência. E, nessa área, tanto o governo da Presidenta Dilma quanto a direção do PT vêm se esmerando em demonstrar uma inesgotável capacidade de errar e persistir no erro.
Longe de mim querer inventariar tudo e fazer diagnósticos profundos sobre o conjunto dos erros políticos do PT. Não é esse meu objetivo. Só quero destacar alguns pontos recentes, exemplos muito mais táticos que estratégicos.
O STF concedeu nesta quinta-feira liminar ao pedido da Senadora Rose de Freitas, do PMDB. Ainda que não invalide as votações já feitas pela Câmara de “análise” das contas de ex-presidentes da República, para abrir caminho para uma possível reprovação das contas de 2014, determinou que as próximas sejam examinadas em sessões conjuntas, convocadas pelo Presidente do Congresso. Tudo sob a batuta do “Coisa-Ruim”, como um colunista d’O Globo apelida o Presidente da Câmara, evangélico de carteirinha e devoto prático do demo, o Sr. Eduardo Cunha.
A Senadora alegou que esse tipo de votação deve acontecer em sessão conjunta do Congresso Nacional, e não separadamente pelas casas. E levou o caso ao STF.
Ora, qual foi o comportamento da bancada do PT na votação?
Votou. Não percebeu a possibilidade de abortar a manobra cunhesca usando o regimento e coonestou a manobra. Por incompetência.
Tendo em vista o pedido da Senadora, e o despacho do Ministro Luís Roberto Barroso, qual deveria ter sido a atitude da bancada?
Se conhecessem a fundo o regimento das casas e o regimento conjunto do Congresso, deveriam ter denunciado a votação e se retirado do plenário. Criariam de imediato um fato de grande repercussão política, desnudando as manobras (uma das, entre tantas) do Coisa-Ruim.
Mas não, a incompetência prevaleceu e foi necessário que uma senadora do PMDB, articulada pelo Renan Soares, desse uma lição de competência parlamentar para essa bancada atônita, incompetente e sem liderança que o PT tem na Câmara dos Deputados.
A incompetência generalizada para lidar com o PMDB não vem de hoje e é outra tragédia. O fato é: vivemos em um presidencialismo de coalizão e o PMDB é um elemento essencial para que o Congresso vote pautas de interesse da nação – não digo nem do interesse do governo presidido pelo PT.
A solução para esse tipo de impasse só tem um caminho: fortalecer os movimentos sociais, com dois objetivos bem concretos. O primeiro é de contrapor o movimento de massas às manobras da direita no Congresso; o segundo, aumentar a bancada de deputados e senadores de esquerda – sejamos claro, não apenas do PT – de modo a diminuir a força da reação no parlamento. Esse é o jogo na democracia que vivemos.
Mas não, o PT, desde o governo Lula, se esmera em manter uma relação no mínimo ambígua, quando não desmobilizadora, com os movimentos sociais. Não adianta dizer que há um “exército do PT” disponível nas ruas.
Não há.
Os movimentos sociais estão desmotivados, desmobilizados e, em grande medida, desmoralizados hoje. Depois do imenso esforço feito na reta final da campanha do ano passado, o que se esperava, no mínimo, era que a Presidenta entendesse que o apoio dos movimentos sociais seria fundamental para que ela pudesse governar.
Isso não é fácil. Há algum tempo publiquei um post sobre o Syriza, no qual um de seus dirigentes chama atenção precisamente para essas dificuldades: “Necesitamos inflingir derrotas a las políticas neoliberales. Para ello, la experiencia griega enseña que movimientos y movilizaciones son la condición indispensable, el punto de partida de este proceso, pero no son suficientes en sí mismos. Hay que tomar el Estado sin dejarse tomar completamente por el Estado. Ahí está todo el problema”. Stathis Kouvelakis em “Tomar el poder sin dejarse tomar por él: diálogo entre el filósofo Alain Badiou e Stathis Kouvelakis, de Syriza”
O PT, ao ganhar as eleições para a presidência, não apenas não pensou nisso, como afastou uma grande quantidade de quadros dos movimentos sociais, além de não se apoiar neles para se contrapor à direita.
E a incompetência e a cegueira prevaleceram. Faz-se o ajuste – necessário, diga-se de passagem, pela mudança das condições internacionais e o aprofundamento e o desdobramento da crise que vem desde 2008 – pela direita. Só agora, timidamente, se propõe o aumento dos impostos dos bancos.
Enquanto isso, e sabendo dos problemas que teria que enfrentar no Congresso, a (des)articulação política do governo pensou em dar uma rasteira no PMDB e evitar a eleição do Coisa Ruim.
Ora, se há algo que o PMDB já deu amplas, reiteradas e consistentes mostras é de competência parlamentar. Querer passar a perna nessas putas velhas da política é no mínimo ingenuidade. No fundo, é incompetência mesmo.
Não foi a primeira vez que se tentou isso. Quando o Lula foi eleito pela primeira vez, o Dirceu já havia costurado um acordo com o PMDB. Lula, inflado pela vitória, preferiu se acochambrar com aquela coleção de partidecos para construir uma maioria parlamentar. Foi confiar no Roberto Jefferson e no Janene.
Deu no que deu.
E agora essas trapalhadas do segundo mandato da Dilma.
É incompetência demais. E o demônio da incompetência cobra seu preço: vem com a cara do Coisa Ruim, do Torquemada Moro e coadjuvantes, inclusive dentro da PF, com a cumplicidade do Ministro da Justiça (veja aqui também observações sobre o caso). Felizmente a oposição tucana – Aécio et caterva também é tão incompetente quanto o PT. E ficamos nas mãos da boa vontade dos eternos donos do poder e da imprensa passar a “ser boazinha”. E o Temer só olhando…
Também, quem tem o Aloísio Mercadante como guru e operador político, desgraça pouca é bobagem.