“A velhice ridícula é, porventura, a mais triste e derradeira surpresa da vida humana”
Machado de Assis
Memórias Póstumas de Brás Cubas
O “príncipe” anda indignado. Declarou ao O Globo que “sente vergonha como brasileiro” pelo que anda acontecendo na Petrobras.
O ex-presidente tem toda razão em andar envergonhado.
Só que anuncia a vergonha por razões erradas.
E tudo está no jornal, para quem lê com atenção.
O Estado de S. Paulo publicou na sexta-feira, dia 14 de novembro, um artigo de Cláudio Weber Abramo muito esclarecedor.
Destaque 1:
A impunidade das empresas era total. O que mudou? “Essa situação jurídica só mudou com a sanção, em 2013, da Lei 12.846, em vigor desde o início de 2014”.
Que lei é essa?
Sua origem é uma mensagem do Poder Executivo ainda em 2010. Quem era o Presidente da República? Luís Inácio Lula da Silva. Foi sancionada em 2013, depois de tramitar da Câmara dos Deputados e no Senado Federal. A resistência inicial do Congresso foi grande. O Deputado Carlos Zaratini (PT-SP) foi escolhido como relator do projeto e conduziu sua tramitação na Câmara. O Senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES). A mensagem do executivo, aliás, foi suscitada por acordo que o Brasil assinou na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), no qual os países membros se comprometeram a promover legislação anticorrupção.
Obediente ao compromisso assumido, o Presidente Lula enviou a mensagem, que tramitou por três anos no Congresso e foi sancionada pela Presidenta Dilma Rousseff.
Destaque 2:
“A Petrobras conta com um esdrúxulo regulamento próprio para suas contratações, inventado durante o governo FHC. Justificado com os habituais argumentos de propiciar maior eficiência aos negócios da estatal, tal regulamento é um verdadeiro modelo daquilo que não se deve fazer quando se escreve regulações para licitações: confere enorme poder discricionário aos funcionários da empresa e torna praticamente impossível contestar suas decisões”.
Essa situação foi criada pelo Decreto n.º 2.745/98. 1998: Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso.
No entanto, o atual governo ainda está devendo. Depois de sancionar a Lei Anticorrupção, o acionista majoritário, que é a União, deveria tomar providências para que essa situação deixasse de existir.
Deveria também, discutir e promover uma ampla reformulação da Lei de Licitações. A atual Lei de licitações, a famigerada 8.666, de 1993 é, ela mesmo, uma excrecência. É cheia de detalhes complicados e inúteis, e parte do princípio que o vencedor será sempre quem oferecer o menor preço. Isso nem sempre é o correto, seja na administração pública ou na vida das pessoas. A combinação entre preço, qualidade do serviço, capacidade técnica para executá-lo é o desejável. A Lei foi sancionada pelo Itamar e referendada pelo Embaixador Rubens Ricúpero, o então Ministro da Fazenda. Que, não por casualidade, é o tal que foi filmado dizendo que “o bom se divulga e as sujeiras se escondem”.
Os remendos que foram sendo feitos não resolvem os problemas e acabam servindo para a velha vantagem dos espertalhões: cria-se dificuldades para vender facilidades.
Mas o que resta é que os governos que tomaram a primeira grande medida para o combate à corrupção foram os de Lula e Dilma.
PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
Fernando Henrique Cardoso deveria andar permanentemente ruborizado de vergonha pela atitude de seu governo em relação à Procuradoria Geral da República. Seu nomeado, Geraldo Brindeiro, ficou conhecido como o Engavetador Geral da República. Como ressaltou Alípio Freire em artigo que já reproduzi neste blog, “Por sua vez, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – O Príncipe dos Sociólogos (“Amore!!!”) e candidato ao título de Maior Reserva Imoral do País, com um requinte próprio dos aristocratas, chegou à sofisticação de ter um Engavetador Oficial de processos – o procurador-geral da República do seu governo, doutor Geraldo Brindeiro que, dos 626 inquéritos criminais que recebeu, engavetou 242 e arquivou outros 217”.
Os tucanos têm mania de dizer que tudo que foi feito pelas administrações petistas é simplesmente “aperfeiçoamento” do que já existia. É assim com a Bolsa Família, execrada nos primeiros anos e hoje “simples evolução dos programas feitos pelo FHC”. O mesmo acontece com as instituições de controle da administração pública.
CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO
A CGU foi criada em 2003, no primeiro ano do governo do Presidente Lula, substituindo dois órgãos anteriormente existentes: a Secretaria Federal de Controle Interno, vinculada ao Ministério da Fazenda, e a Ouvidoria-Geral da União, vinculada ao Ministério da Justiça.
A “simples evolução” foi a criação de um órgão autônomo, com status de ministério, diretamente ligado à Presidência da República.
Os resultados, entre outros, são evidentes na quantidade de processos e procedimentos administrativos e judiciários promovidos pelo órgão. Já citei aqui um pequeno exemplo neste mesmo blog http://www.zagaia.blog.br/?p=153 : “de janeiro de 2003 a agosto de 2014, as expulsões punitivas de funcionários estatutários da administração federal somaram 4.979. É informação pública, no site da CGU, aqui.”
Fernando Henrique Cardoso realmente deveria se envergonhar de não ter feito nada disso.
POLÍCIA FEDERAL
A atuação da Policia Federal é outra questão para deixar vermelha de vergonha a cara do ex-presidente FHC. De uma rotina de nomeações políticas, transferência de delegados, falta de recursos para agir, a Polícia Federal passou a ter atuação constante, sistemática.
A esculhambação na PF era tamanha no governo FHC que a instituição era usada inclusive para resolver as pinimbas internas do governo. Ou já esqueceram do famoso caso Lunus, quando o Serra, candidato, usou a instituição para detonar a candidatura da “aliada” Roseana Sarney?
Se fosse apenas briga de compadres já era coisa séria. Infelizmente, até o que a PF tentou fazer de bom foi boicotado pelo falso-moralista Fernando Henrique Cardoso. Todas as tramoias da privataria tucana já foram relatadas pelo jornalista Amaury Ribeiro em seu livro, jamais contestado, A Privataria Tucana. Ribeiro nos brindou, recentemente, com uma informação adicional que diz respeito a um assunto da atualidade: a ligação do doleiro Alberto Yussef com esse processo.
“Nas 1.057 páginas que detalham todas as remessas feitas por doleiros por intermédio da agência do banco Banestado em Nova York está documentado o caminho que o caixa de campanha de FHC e do então candidato José Serra, Ricardo Sérgio Oliveira, usou para enviar US$ 56 milhões ao Exterior entre 1996 e 1997. O laudo dos peritos mostra que, nas suas operações, o tesoureiro utilizava o doleiro Alberto Youssef, também contratado por Fernandinho Beira-Mar para remeter dinheiro sujo do narcotráfico para o Exterior”.
Por essas e tantas outras, Fernando Henrique Cardoso tem toda razão de estar muito envergonhado. Só não está mais pelo alto consumo de óleo de peroba para manter lustrada sua faccia de intelectual.