A frase do Chico Buarque: “Agora o Brasil não fala fino com os EUA e grosso com a Bolívia” é um dos “memes” recorrentes da atual campanha presidencial.
Lembrei, no caso, do então Chanceler Celso Lafer, que foi obrigado a tirar os sapatos ao passar pela imigração em Miami, quando foi tratar, em 2002 (último ano do governo FHC), da imposição de sobretaxas aos produtos siderúrgicos brasileiros exportados para aquele país.
Lafer reclamou, mas submeteu-se ao vexame. E, o que é pior, não retaliou quando da visita de funcionários dos EUA ao Brasil.
A justificativa do Departamento de Estado foi de que eles não controlavam a segurança dos aeroportos. No entanto, os chanceleres de certos países não foram submetidos ao vexame. E não porque fossem mais aliados dos EUA do que o Brasil era na ocasião. Mas, sim, porque eram economias robustas.
O que o Brasil não era.
A questão das sobretaxas ao aço era claramente uma violência contra a economia brasileira. Não teve papo de acordos bilaterais sobre o assunto, que só foi resolvido bem mais tarde no âmbito da OMC, que decidiu em favor do Brasil e dos demais países que secundaram a reclamação brasileira.
Certamente não foi um caso tão grave quanto a espionagem denunciada mais tarde pelo Snowden, que fez a Presidenta Dilma cancelar a visita de Estado que faria a Washington. Mas foi uma violência contra os tratados que regulam os direitos recíprocos dos diplomatas.
E o Chanceler é o representante maior do Estado brasileiro no exterior, sobrepujado tão somente pelo próprio Presidente da República.
Celso Lafer fez muxoxo e reclamou junto ao subsecretário de Estado dos EUA em uma recepção a que este compareceu na Embaixada Brasileira em Washington. O embaixador era o prócer tucano Rubens Barbosa, cotado como futuro chanceler em uma eventual e remota vitória do Aécio.
Não consta nem que tivesse havido uma reclamação formal da Embaixada.
Ficou naquele papo de coquetel: “Pô, não deviam me tratar assim”.
Celso Lafer teve que ficar descalço três vezes nessa visita. Fez cara feia, mas ficou.
Certo mesmo era revistar a Condoleeza Rice na sua visita seguinte ao nosso país. Mas, como somos cavalheiros e simpáticos, engolimos a ofensa.
Ao que conste, nenhum de nossos chanceleres – Celso Amorim, Antônio Patriota e Luís Alberto Figueiredo Machado – tenham tirados os sapatos quando visitaram a gringolândia.